quinta-feira, 26 de maio de 2011

Código Florestal: retrocesso e vergonha nacional

25/05/2011 - 11:32

Código Florestal: retrocesso e vergonha nacional
O Código Florestal Brasileiro foi devastado na noite de ontem com aprovação de um texto que permite culturas nas APP’s e anistia produtores que desmataram até 2008. Uma noite histórica e de prejuízo ao meio ambiente e para as gerações futuras do Brasil. O substitutivo do Código Florestal Brasileiro, elaborado pelo relator Aldo Rebelo, com apoio da bancada ruralista, foi aprovado e representa um grande retrocesso.
“O Brasil acordou hoje com a notícia do assassinato de um defensor da floresta amazônica”, disse Paulo Adario, diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace, homenageando José Claudio Silva, líder seringueiro morto na véspera da votação na Câmara por madeireiros no Pará. “E foi dormir com a notícia de que a maioria dos nossos deputados aprova o assassinato de nossas florestas”, completou.
O PSOL manteve sua posição contrária ao relatório Aldo Rebelo. “O PSOL diz não aos que entendem que o Código Florestal Brasileiro tem que ser decepado, que a motosserra tem um papel civilizatório fundamental. Este texto aprovado é um retrocesso, que inclusive vai atrás da primeira lei de preservação de florestas do Brasil, de 1934. O PSOL diz sim ao cuidado ambiental, a uma legislação para ser cumprida, inclusive à exceção e não à regra para apoiar serviços ambientais daqueles que realmente precisam produzir”, afirmou o líder do PSOL, deputado Chico Alencar.
O texto base foi aprovado por 410 votos a favor e 63 contra. Os únicos partidos que votaram em bloco contra as mudanças foram PSOL e PV. DEM, PCdoB, PMDB, PHS, PMN, PP, PRB, PRP, PRTB, PSL, PTB, PTC e PTdoB votaram em bloco a favor do relatório Aldo Rebelo.
Na prática, o projeto aprovado produziu o milagre de transformar uma legislação escrita para defender as florestas brasileiras em lei de incentivo à expansão desenfreada da agricultura e da pecuária. Ele premia o desmatamento, propondo a anistia a desmatadores, e incentiva a expansão sobre o que resta ao Brasil de matas nativas, reduzindo as exigências para que fazendas mantenham um percentual de seus terrenos com vegetação original e enfraquecendo a capacidade do governo central de gerir o patrimônio ambiental brasileiro. Entre outros pontos críticos, o novo Código define a isenção da reserva legal para as propriedade de quatro módulos (20 a 400 hectares, dependendo do Estado).
“É preciso desmistificar aqueles que dizem que o relatório não traz desmatamento. Como não traz desmatamento? Só pela mudança do cômputo da reserva legal com a APP; só pela não recuperação de imóveis até 4 módulos, 70 milhões de hectares de terra aprovados por todos os levantamentos; só pela ocupação das APPs; só pela flexibilização da legislação ambiental para os Estados, para fazendeiro pressionar Governador e Prefeito; só pela compensação em outro bioma, que não vai existir, porque desmata em Santa Catarina, na Mata Atlântica, e diz que vai compensar na Bahia, na Mata Atlântica! Quem é que vai fiscalizar? Os ruralistas sabem que isso é uma grande mentira”, criticou o deputado Ivan Valente. “Eles não querem nenhum comando, nenhum controle. O que querem nós sabemos: é usar a motosserra à vontade”.
Dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) indicam a existência de cerca de 13 mil multas com valor total de R$ 2,4 bilhões até 22 de julho de 2008. A maior parte delas pelo desmatamento ilegal de APPs e de reserva legal em grandes propriedades da Amazônia Legal. Os estados de Mato Grosso, Pará, Rondônia e Amazonas respondem por 85% do valor das multas aplicadas até julho de 2008 e ainda não pagas.
O novo Código também põe em dúvida a capacidade do Brasil de manter seus compromissos de redução de emissões de gases do efeito-estufa assumidos durante a conferência  do clima de Copenhague, em dezembro de 2009. O desmatamento é o principal responsável pela posição de destaque do Brasil no ranking dos países que mais contribuem para o aquecimento global (é o quinto maior emissor de gases-estufa). E depois de uma tendência de queda das taxas de derrubada na Amazônia nos últimos cinco anos, ele voltou a subir na região.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), divulgou na semana passada que o desmatamento na Amazônia em abril havia sido 570% maior do que o registrado no mesmo mês do ano passado. “Há uma clara corrida pelo desmatamento incentivada pelas modificações efetuadas no código”, disse Paulo Adario.
Emenda pior que o soneto
Outra polêmica foi a emenda nº 164, feita pelo PMDB, que só piorou o texto de Aldo Rebelo. A emenda permite o uso das áreas de preservação permanente (APPs) já ocupadas com atividades agrossilvipastoris, ecoturismo e turismo rural e autoriza os Estados a participarem da regularização ambiental.
O governo federal tentou barrar a emenda, com o líder do governo Cândido Vaccarezza afirmando que a presidente Dilma Roussef era contra e que se fosse preciso vetaria a proposta. A base governista rachou, mas os ruralistas conseguiram aprovar a emenda por 273 a 182 votos. Agora, a estratégia do governo é modificar o texto no Senado, o que, se acontecer, obrigará a nova análise pela Câmara dos Deputados.
“A Emenda nº 164 é a que ainda piora o que já é péssimo”, disse o deputado Ivan Valente. “É a farra do boi. O setor que quer mudar o código quer passar para um órgão estadual, integrante do SISNAMA, o poder para determinar inclusive o que é área de utilidade pública, de interesse social e de baixo impacto. Querem eliminar a presença do IBAMA, do CONAMA. O texto proporciona uma corrida para ver quem dá mais incentivos ao desmatamento, essa é a verdade”, disse Ivan Valente.
Ao final da votação, o deputado lembrou que o PSOL atuou na Comissão Especial e na Câmara de Conciliação, contribuindo consistentemente para o debate feito na Câmara, aliando a proteção ao meio ambiente e o apoio ao pequeno produtor. “Nós defendemos a função social e ambiental da terra. É por isso que tem que haver, sim, regulação da terra, para ser bem comum da população. E é por isso que esse tipo de emenda que se refere ao pequeno, na verdade, está mentindo para o povo. Na verdade, nós defendemos o pequeno o tempo todo. O que nós não defendemos é o agronegócio exportador. O relatório que foi aprovado é uma vergonha”.
O líder Chico Alencar disse que “o PSOL diz não aos que usam as reais dificuldades do pequeno agricultor, do agricultor familiar da cooperativa como biombo para a liberação geral da atividade muitas vezes predatória do grande empreendimento agrícola. O PSOL diz não àqueles que concebem reserva legal e Área de Preservação Permanente como confisco, considerando, como no tempo do latifúndio, da monocultura e da escravidão, o direito de propriedade como ilimitado, negando inclusive a função social da propriedade que a Constituição garante. O PSOL diz não aos que segmentam a vida entre nós, seres humanos, e a natureza, e dissociam, numa visão economicista retrógrada, a produção da preservação e do cuidado ambiental. O PSOL diz não ao embaixador norte-americano, porque ele mandou um telegrama , em 10 de fevereiro, dizendo que reserva legal de 80% na Amazônia era um absurdo e que essas ideias de preservação do Brasil eram muito antiquadas. Portanto, esse suposto interesse multinacional a favor de ambientalistas não se confirma, aliás, nem ao longo da história nem agora”.
O PSOL seguirá sua luta contra essas mudanças no Código Florestal. Há um debate a ser feito no Senado e também é preciso cobrar da Presidenta Dilma que cumpra sua promessa de campanha de não aprovar nenhuma lei que autorize desmatamentos. Caso a Presidenta Dilma não vete o novo Código, o PSOL entrará no Supremo Tribunal Federal com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o texto. A Constituição Federal brasileira tem como um de seus princípios o não-retrocesso legislativo, que será desrespeitado caso o novo Código Florestal entrar em vigor.

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